JUNHÃO
Quarenta e um anos de idade. O tempo passa, mas a vida dele continua do mesmo jeito: não trabalha, nunca se casou, dorme o dia inteiro, farreia todas as noites e ainda mora na casa dos pais. Embora viva cheio de regalias, os conflitos com a mãe permanecem inalterados.
CEIÇA
Sessenta e um anos de idade. Está com uma aparência muito envelhecida demonstrando ter uma idade muito além da real. As suas preocupações com o filho deixaram o rosto todo enrugado, os olhos vermelhos, decaídos, cabelos grisalhos e mal-amanhados. Porém continua com a mesma natureza forte e vigor na voz, principalmente na hora em que faz os escândalos nos embates com o filho. Por falar nisso, ela entra em ação reclamando com ele ao vê-lo passar para ir ao banheiro:
– Quero saber quando vai decidir arranjar um emprego!… Você não se cansa de ser um parasita?!…
JUNHÃO
Ele toma um susto e para, mas continua com a mesma calma de sempre, principalmente quando se sente pressionado. Para se safar do problema responde pausado tentando abrandar a raiva dela:
– Querer trabalhar eu quero, mas na atual crise da economia mundial a taxa de desemprego aumentou em todos os países. No Brasil então, nem se fala…
E argumenta para tentar convencê-la:
– Não sei qual o motivo, mas qualquer agitação no exterior, por menor que seja, quem sofre primeiro são os habitantes daqui. Aliás, eu imagino o porquê…
CEIÇA
Fica irritada com o que ouve e brada:
– E eu quero lá saber de merda de economia!!!… O que “mim” interessa é saber quando você vai resolver começar a trabalhar!…
Ainda muito revoltada, argúi:
– Procure um emprego e alugue uma casa pra se mudar daqui da rabeira da minha saia. Depois se case e siga o exemplo de seu pai pra virar um homem de bem…
JUNHÃO
Abaixa a cabeça e fica calado esperando que a mãe se esqueça do assunto e a conversa não vire em uma confusão desenfreada.
CEIÇA
Porém, ela continua a vociferar porque está muito brava com a situação do filho:
– Você é um oportunista, por isso fica na “espinha mole”, porque não quer sair da mordomia que tem aqui em casa…
JUNHÃO
Azucrinado com a insistência dela, fica enfezado e argumenta:
– Estou me esforçando para conseguir um trabalho, mas quando eu vou tentar uma vaga num emprego, tem milhares de candidatos numa fila que nunca anda.
Para justificar a sua inércia, diz:
– A demora na espera é tanta que chega o horário do almoço e eu fico com fome. Então volto pra casa para almoçar, consequentemente, não posso retornar porque ao sair de lá acabo perdendo a minha vaga na fila.
Com cinismo, tenta influenciar a mãe:
– Mas, fique tranquila porque eu já distribuí uns currículos e eles vão mandar me chamar em casa.
CEIÇA
Fica enfurecida com o que ouve e exclama raivosa:
– Vão mandar chamar você zorra nenhuma, seu faroleiro!… Se indo lá na porta deles não consegue o emprego, quanto mais se ficar em casa de papo pro ar esperando eles chamarem!…
JUNHÃO
Não responde diante das evidências, porém resmunga:
– Essa velha é gente ruim; uma carne de pescoço…
CEIÇA
Inconformada diante da falta de ânimo do filho em conseguir um trabalho, grita raivosa:
– O nome disso é preguiça, seu aproveitador!… Você é um inútil! Só faz isso, porque tem onde comer e dormir de graça!…
JUNHÃO
Continua renitente e fala:
– Não é nada disso… Eu sou um cara muito esforçado… Você é que não quer enxergar e fica exagerando tudo ao seu bel-prazer.
Depois fala baixo criticando a mãe:
– Essa criatura gosta de viver perturbando o meu juízo. Eu não aguento mais ela ficar apertando a minha mente…
CEIÇA
Cada vez mais irada, fica exaltada e brada:
– Deixe de ser cara de pau!… Você precisa arranjar um emprego urgente!… Ou então procure uma mulher e vá morar na casa dela.
A seguir lastima o seu infortúnio:
– Eu já não aguento mais carregar esse peso morto!…
JUNHÃO
Encolhe os ombros e faz uma careta de desdém aparentando não dar importância ao que ela fala.
CEIÇA
Completa demonstrando indignação:
– Você é a desilusão da nossa vida. Eu e seu pai temos vergonha dos nossos amigos e parentes por sua causa.
Descontente com a vida leviana do filho, afirma:
– Todos os nossos conhecidos estão contentes porque os filhos deram gosto a eles nos estudos.
Ainda desgostosa continua relatando a sua frustração:
– Eles se esforçaram nos livros e tiveram boas formaturas na universidade. Hoje são independentes, casados e moram em boas residências…
Muito zangada, indaga de modo impositivo, encarando-o com as mãos nas cadeiras:
– E quanto a você, o que é na vida?!… É um pra nada!… Um sem futuro! É pra isso que estamos gastando rios de dinheiro com você?!…
Muito revoltada continua questionando:
– De que adianta só viver em farras, nos shows mequetrefes de artistas fajutos e correndo atrás das quengas?
Refletindo sobre a vida do filho, fica angustiada e coloca as mãos na cabeça perguntando:
– E de agora em diante, como vai ser a sua vida? Hem?!… O tempo está passando e você ficando velho. Já pensou qual vai ser o seu futuro?
Queixosa diz:
– Quando perguntam: cadê o Júnior, já casou, já tem filhos, os netinhos de vocês são bonitos? O Júnior é formado em que? Ele está bem empregado?…
E continua lamentando:
– Eu já não aguento mais de ficar com cara de songamonga inventando estórias sobre o filho maravilhoso que temos.
Tristonha, relata a sua mágoa:
– Morreria de vergonha se tivesse de contar a verdade às pessoas de que você é averso aos estudos, nunca quis trabalhar e vive fazendo treitas para roubar os pais a fim de esbanjar o dinheiro nas farras…
Depois lamenta:
– E o pior de tudo é a sua “inresponsabilidade”. Já está cheio de filhos “na rua” e, como se não bastasse, empurra as pensões alimentícias dos seus “bastardinhos” pra gente pagar.
Demonstrando sentimento, fala com amargor:
– Eu fico morta de vergonha com a curiosidade das pessoas indiscretas que ficam perguntando sobre a sua vida. Até parece que as pestes já sabem das suas malandragens e ficam azucrinando o meu juízo.
Ressentida com a suspeita, comenta:
– Por sua causa, o meu nome deve estar servindo de gozação no meio das fofoqueiras. Ah, sujeito ordinário!…
E comenta demonstrando tristeza:
– Mas também, o que a gente vai dizer quando perguntam?… Que o nosso Juninho tem uma vida desregrada?… Que é um pilantra?!…
Depois conclui resoluta:
– Só Jesus na causa… O único jeito vai ser eu bloquear pro resto da vida essas falsas amizades intrometidas que gostam de viver fazendo fuxico.
JUNHÃO
Continua emudecido demonstrando impaciência com o bolodório da mãe.
CEIÇA
Irritada esbraveja:
– Você devia casar urgente. Faz tempo que vive empatando aquela moça, a Dorinha, e até hoje não fala em casamento!… Quero que case logo, pra sair daqui de casa!
JUNHÃO
Comprime os lábios, balança a cabeça negativamente, olha para ela e murmura com a voz lânguida aparentando estar constrangido:
– Quanto à tal namorada, já terminei o namoro com ela…
CEIÇA
Tem um sobressalto e inquire nervosamente:
– Não é possível!… Depois de quatorze anos terminou o namoro por quê?!… Como é que larga uma moça fina, educada, direita e de boa família como aquela?!…
JUNHÃO
Demonstrando falsa consternação e explica o motivo:
– É por isso mesmo!… Eu não queria empatar o tempo dela!…
CEIÇA
Arregala os olhos e olha com firmeza para ele; está boquiaberta sem acreditar no que ouviu. Ao perceber a insensatez do filho, balança a cabeça e exclama:
– Ah, sujeito!…
Autor: Joswilton Lima


Joswilton Lima é natural de Ilhéus-Ba, mas é domiciliado há mais de vinte anos em Morro do Chapéu. Tem formação em Ciências Econômicas, mas sempre foi voltado para as artes desde a infância quando começou a pintar as primeiras telas e a fazer os seus primeiros escritos. Como artista plástico participou de salões onde foi premiado com medalhas de ouro e também de inúmeras exposições coletivas nos estados da Bahia, Sergipe e Pernambuco. Possui obras que fazem parte do acervo de colecionadores particulares e entidades tanto no Brasil, quanto em países do exterior, a exemplo dos E.U.A, Portugal, Espanha, França, Itália e Alemanha. Possui o site www.joswiltonlima.com onde tem uma mostra de algumas de suas pinturas em diferentes técnicas e estilos, sendo visualizado por inúmeros países.
Em determinada época lecionou pintura em seu atelier no bairro de Santo Antonio Além do Carmo, em Salvador, e foi membro de comissões julgadoras em concursos de pintura. Nesse período exerceu a função de Diretor na Associação dos Artistas Populares do Centro Histórico do Pelourinho (primitivistas e naif’s), em Salvador.
Como escritor também foi premiado em diversos concursos de contos tendo lançado um e-book com o título “Enigmas da Escuridão”, com abordagem espiritualista, tendo obtido a nota máxima de 5 estrelas de leitores do site www.amazon.com.br Outros contos e romances estão sendo escritos.
Concomitante às atividades artísticas sempre exerceu funções laboriosas em diversos setores produtivos, tendo se aposentado recentemente na Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia, onde trabalhou por muitos anos na Fiscalização.