Com a retomada das atividades em nosso site, continuamos a usufruir da criatividade de amigos (as) que, por meio da sua atividade literária, presenteiam nosso leitores com textos de encher os olhos e fazer a alma viajar.
Assim, os Episódios do Junhão serão revisitados e começamos com a presentação do livro que esta disponível pela Amazon.com.br no endereço https://www.amazon.com.br/Epis%C3%B3dios-Junh%C3%A3o-Joswilton-Jorge-Nunes/dp/B08PQP2SF2 e você confere o novo episódio:
A CONTA DOLOROSA
Incansável na sua vontade de viver na esperteza às custas do pai para poder manter a vida de bon-vivant, Junhão não para de articular para continuar na boa-vida que leva sob os auspícios de Ceiça. Mas, cansada de tantos golpes aplicados por ele, será que a mãe finalmente irá conseguir impor limites ao filho?
JUNHÃO
Vinte e um anos de idade. Está deitado no sofá da sala com a cabeça recostada nas almofadas que estão apoiadas num dos braços do móvel. As pernas estão estiradas e os pés calçados com tênis sujos de barro colocados sobre o outro braço da poltrona. O telefone fixo do apartamento está sobre uma banqueta e ele conversa tranquilamente com diversas amigas; uma ligação após a outra. Quando está em casa repete essa operação todos os dias sem se preocupar com as despesas extras que irão surgir na conta telefônica.
CEIÇA
Quarenta e um anos de idade. Quando chega na sala fica indignada com as atitudes do filho espaçoso e arregala os olhos. Está irada com o uso indevido do telefone por longos períodos de tempo. Isso provoca a sua raiva e ela solta fogo pela boca. Revoltada grita para ele:
– Oxente, aqui é a casa da “mãe Joana”?!!!… Quero ver o que você vai fazer quando a conta da companhia telefônica chegar! Ou melhor: você não vai fazer nada, porque não trabalha e só vive “duro”!…
Incisiva, grita nervosa:
– E tire os pés sujos de cima do sofá, sua “miséra”!… Você só é desleixado assim, porque não sabe quanto custa nada. Se fosse fruto do suor do seu trabalho, com certeza saberia preservar o móvel.
E continua com os esporros:
– Já estou com as mãos na cabeça de tanta preocupação com as despesas que você dá aqui em casa. Além do telefone, tem a conta da luz que é enorme. O ar condicionado do seu quarto parece que é o de uma repartição pública. Você liga tudo e não se importa em desligar. Toda hora eu tenho que percorrer o apartamento pra corrigir as suas falhas.
Prossegue com as alegações:
– Quando você vai no banheiro, então, ai, ai!… O “dotôrzinho” só toma banho quente, mesmo num calor infernal desse. Não sei como aguenta ficar mais de duas horas debaixo d’água com o chuveiro ligado. Parece que é o homem que tem mais “lodo” no mundo na hora do banho. Tenho a impressão de que você faz tudo isso só pra ver a derrota financeira do seu pai.
E conclui:
– Além disso tem as despesas com comida. Misericórdia!… Você bota “pocando” e não tem comida que chegue! Come tudo parecendo um bicho.
JUNHÃO
Não estava esperando por essa reação abrupta da mãe e se assusta. Jamais iria imaginar que a zelosa mãe estava fazendo questão da comida. Levanta-se imediatamente do sofá e fica em silêncio. Os olhos estão esbugalhados esperando o que está por vir.
CEIÇA
Continua com a reclamação:
– Você deve estar com algum distúrbio mental pra ficar o dia inteiro “pendurado no telefone” …
JUNHÃO
Demonstrando calma, diz:
– Rapaz…, você faz o maior bafafá à toa!… Estou ligando a cobrar pra minhas amigas… Tenho um bocado de assuntos relevantes pra resolver com elas.
CEIÇA
Incrédula, contesta:
– Assunto relevante uma ova!… Qual é o assunto que você tem pra resolver, “cabra” sem-vergonha! Só se for assunto de safadeza! Além do mais, duvido muito que essas quengas tenham condições financeiras pra receber esse tanto de ligações a cobrar o dia inteiro.
JUNHÃO
Apesar de estar injuriado, fica calado de cabeça baixa.
CEIÇA
Alterna o humor e sorri debochando. Depois continua com o escárnio:
– Essas fulanas que vivem batendo papo pelo telefone o dia inteiro devem ser tudo “pé rapado”, iguais a você. Duvido muito que sejam mulheres direitas.
JUNHÃO
Abaixa a cabeça e balança negativamente, reprovando a atitude da mãe.
CEIÇA
Continua vociferando:
– Elas são um monte de “vagaba”. Essas “periguetes” ficam encegueiradas atrás de você pra lhe tirar dos estudos.
A seguir vaticina:
– No futuro quando você estiver velho e não for ninguém na vida, com certeza vão te dar um pontapé no traseiro pra irem procurar algum “dotô” cheio da grana…
JUNHÃO
Com uma calma incomum, tenta contornar a situação:
– A senhora está sendo injusta difamando as moças. Todas elas trabalham: são médicas, advogadas, enfermeiras, engenheiras…
CEIÇA
Está de pé se remexendo toda demonstrando nervosismo. Interrompe a fala dele e diz desconfiada:
– Hum!… Está pensando que sou alguma trouxa?!… Qual é a mulher que tem uma boa profissão vai querer perder tempo com um “oreba” abestalhado e sem futuro igual a você?
JUNHÃO
Reflete um pouco e diz:
– Claro, que elas me querem, porque sou jovem, rico, bonito e famoso!
CEIÇA
Ao ouvir essa declaração cínica, dá uma gargalhada. Depois dá o seu veredicto, como genitora:
– Realmente você é lindo e novinho, mas rico?!… Quem perdeu pra você achar essa riqueza? E famoso?!… Só se for de sem-vergonhice e preguiça…
A seguir, de modo debochado, lança um jato de veneno para fazê-lo pensar no futuro inglório que terá com a vida despreocupada que está levando. Aconselha-o de forma maternal:
– Todo mundo envelhece, meu filho…, duvido muito que elas vão te procurar, quando você tiver cinquenta ou sessenta anos “duro” de grana do jeito que anda… Eu conheço esse tipo de quenga. Elas são mais malandras do que você.
JUNHÃO
Continua tranquilo querendo amenizar a discussão:
– Pelo menos espere a conta telefônica chegar; não sofra por antecipação…
CEIÇA
Fica calada diante da segurança da afirmação dele.
FINAL DO MÊS – As benditas contas chegaram…
JUNHÃO
Entra apressado na sala do apartamento com as correspondências que buscou na portaria do prédio. Mas, esquecido das ligações telefônicas que fizera, coloca todas as faturas em cima da mesa. A seguir vai para o seu quarto descansar, depois do “trabalho extenuante” que teve. De repente ele se assusta com um grito estrondando na sala. Levanta-se rápido e tenta escutar o escrache para se inteirar do que se trata. Como não consegue entender o motivo da gritaria e imaginando que poderá ser o pivô da confusão, vai para a sala fingindo inocência.
CEIÇA
Ficou histérica no momento que abriu os envelopes recebidos e viu o enorme valor a pagar da conta telefônica. Está com os olhos vermelhos, esbugalhados, soltando fumaça pelas orelhas e fogo pela venta. Junhão chega e fica quieto, assombrado. A mãe quando o vê, sacode o papel com a fatura na direção do seu rosto e brada raivosa:
– Mas que merda é essa?!… “Ô miséra”, você não disse que as ligações que fez eram a cobrar?!… Mentiroso descarado!… Tem ligações suas até “pru” inferno!
JUNHÃO
Sentindo-se acuado, senta-se no sofá e coloca os cotovelos sobre os joelhos e apoia o rosto com as mãos. Tem o olhar triste, por causa do flagrante. Demonstra estar arrependido por causa da sua ânsia em descansar. Na pressa havia se esquecido de rasgar a fatura da conta telefônica e depois jogado os pedaços do papel no vaso sanitário, dando descarga em seguida. Se tivesse procedido assim, jamais seria descoberto e não estaria passando por nenhum vexame.
Desolado, apenas resmunga:
– Que vacilo o meu!… É por isso que dizem não haver crime perfeito.
CEIÇA
Continua irritada e ameaça retaliar:
– Arranje um jeito de pagar essa conta absurda, seu “Zé Pilintra”, porque eu não vou assumir a vagabundagem de ninguém. Você que tem “culpa no cartório” que vá pedir dinheiro para pagar a conta telefônica às suas quengas vadias que passam o tempo inteiro no telefone ouvindo você falando merda!
Quase explodindo de raiva, vaticina o castigo:
– Providencie o pagamento com urgência porque, senão, você vai ficar sem receber mesada até terminar de pagar o valor enorme dessa conta do telefone!…
Depois se lembra de algo e exige:
– Já que você falou que as sujeitas são “dôtoras”, peça também pra elas darem um adjutório pra pagar a conta da luz que você usa.
JUNHÃO
Continua calado, pensativo, na mesma posição.
CEIÇA
Conclui ofegante:
– Você, seu ordinário, vai “mim” pagar nem que seja a pulso! Dê seu jeito! E tem mais: está proibido de pegar no aparelho telefônico pelo resto da sua vida, seu songamonga!
JUNHÃO
Ouve em silêncio de cabeça baixa. Resignado, coça a barba, levanta a cabeça, olha para o teto do apartamento e faz uma careta de desagrado, coçando a testa. Depois dá um largo sorriso e fala baixinho de modo que a mãe não o ouça:
– Pra tudo tem jeito, me aguarde… Daqui a pouco a raiva dela passa e eu sou absolvido.
Volta para o quarto e conclui sorrindo:
– A coroa é gente boa; aposto que ainda hoje ela vai me dar a grana pra minha farra.
Autor: Joswilton Lima
Resumo da biografia do autor:
Joswilton Lima é natural de Ilhéus-Ba, mas é domiciliado há mais de vinte anos em Morro do Chapéu. Tem formação em Ciências Econômicas, mas sempre foi voltado para as artes desde a infância quando começou a pintar as primeiras telas e a fazer os seus primeiros escritos. Como artista plástico participou de salões onde foi premiado com medalhas de ouro e também de inúmeras exposições coletivas nos estados da Bahia, Sergipe e Pernambuco. Possui obras que fazem parte do acervo de colecionadores particulares e entidades tanto no Brasil, quanto em países do exterior, a exemplo dos E.U.A, Portugal, Espanha, França, Itália e Alemanha.
Em determinada época, lecionou pintura em seu atelier no bairro de Santo Antônio Além do Carmo, em Salvador, e foi membro de comissões julgadoras em concursos de pintura. Nesse período exerceu a função de Diretor na Associação dos Artistas Populares do Centro Histórico do Pelourinho (primitivistas e naif’s), em Salvador.
Como escritor também foi premiado em diversos concursos de contos tendo lançado um e-book com o título “Enigmas da Escuridão”, com abordagem espiritualista, tendo obtido a nota máxima de 5 estrelas de leitores do site www.amazon.com.br Outros contos e romances também estão sendo escritos.
Concomitante às atividades artísticas, sempre exerceu funções laboriosas em diversos setores produtivos e, por último, se aposentou na Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia, onde trabalhou por muitos anos na Fiscalização.
Agora tem o prazer de apresentar aos leitores do site www.leoricardonoticias.com.br o seriado de crônicas intituladas Episódios do Junhão, com as quais espera que tenham uma leitura agradável e de reflexão.