Catolicismo à baiana, devagar, quase parando: ‘Sacramentos: a torneira que nos conecta à fonte da graça’

 

Catolicismo à baiana, devagar, quase parando

 

 

 

Você pode conferir as séries anteriores a partir dos link: Do Sentido da vida a autoridade da igreja; A criação, anjos e demônios, o mal o pecado e o ser humano

 

 

 

Liturgia o serviço de Deus a seu povo.

 

 

Sacramentos: a torneira que nos conecta à fonte da graça

 

“Do lado aberto de Cristo na cruz, jorraram os sacramentos da Igreja.” Catecismo da Igreja Católica, n. 766

 

 

O mistério da sede

 

 

Você já tentou matar a sede bebendo apenas o vapor que sobe de uma chaleira? A água está presente, sim, mas sem forma nem caminho até sua boca. Nada sacia. Essa imagem singela ajuda a entender uma verdade fundamental da fé cristã: a graça de Deus está em toda parte, mas não é eficaz em nós sem um canal que a conduza até o nosso coração. Esse canal são os sacramentos.

 

Muitos hoje vivem com sede espiritual — de sentido, de perdão, de paz — mas tentam saciá-la no ar rarefeito de uma espiritualidade subjetiva, sem forma, sem encarnação. A fé católica, porém, sempre proclamou com vigor: a graça não é apenas uma energia etérea ou um sentimento interno. É um dom real, objetivo, eficaz — e nos é dado sacramentalmente.

 

Cristo, ao fundar a Igreja, não nos deixou apenas palavras ou bons conselhos. Ele nos deixou gestos concretos, ritos visíveis, sinais eficazes. A graça tem encanamento. E esse encanamento são os sacramentos.

 

O que é um sacramento?

 

 

“Os sacramentos são sinais sensíveis e eficazes da graça, instituídos por Cristo e confiados à Igreja, por meio dos quais nos é dispensada a vida divina.”

CIC 1131

 

A definição é densa, mas essencial. Vamos por partes:

 

•     Sinais sensíveis: cada sacramento usa elementos visíveis e palpáveis (água, pão, óleo, palavras, gestos). A fé católica nunca foi desencarnada — ela usa o corpo para alcançar a alma.

 

•     Eficazes: não são apenas símbolos. Produzem o que significam. O Batismo não simboliza o perdão: ele o realiza. A Eucaristia não representa Jesus: é Jesus.

 

•     Instituídos por Cristo: nenhum sacramento foi inventado pela Igreja. Todos têm raiz nos gestos e palavras de Jesus nos Evangelhos.

 

•     Confiados à Igreja: Cristo deu autoridade à Igreja para administrá-los com fidelidade e zelo. É por isso que ela determina quem pode celebrá-los, como e em que condições.

 

 

São sete os sacramentos:

 

  1. Batismo

 

  1. Confirmação

 

  1. Eucaristia

 

  1. Penitência

 

  1. Unção dos enfermos

 

  1. Ordem

 

  1. Matrimônio

 

Eles acompanham a vida inteira do cristão, da entrada na Igreja até a hora da morte. E cada um deles toca uma dimensão concreta da existência humana: o nascimento, a maturidade, a comunhão, o pecado, a enfermidade, o chamado e o amor.

 

 

 

Os três elementos essenciais do sacramento

 

Todo sacramento tem três elementos que garantem sua validade:

 

•     Matéria: o elemento sensível usado (água, óleo, pão e vinho).

 

•     Forma: as palavras sacramentais. Exemplo: “Eu te batizo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”.

 

•     Ministro: quem celebra validamente. Em geral, o sacerdote ou bispo, mas com exceções (o Batismo pode ser conferido por qualquer pessoa, em caso de necessidade).

 

Sem esses três elementos, o sacramento não é válido. E mais: mesmo com a validade, é preciso distinguir:

 

•     Licitude: se foi celebrado conforme as normas da Igreja.

 

•     Frutuosidade: se o sacramento produziu fruto na alma do fiel. Isso depende de sua disposição interior: fé, arrependimento, amor.

 

Por exemplo, um fiel que comunga validamente, mas em pecado grave e sem arrependimento, não recebe os frutos espirituais da Eucaristia — e comete sacrilégio (cf. 1Cor 11,27-29).

 

 

 

A analogia do encanamento

 

Voltemos à imagem da água. Imagine um reservatório imenso, cheio de água pura. Esse reservatório é a Cruz de Cristo, de onde jorra a graça redentora. Mas, para que essa água chegue até nossa casa, são necessários tubos, válvulas, torneiras. São eles que canalizam a água, sem a qual morreríamos de sede.

 

Assim também os sacramentos.

Eles são os tubos, válvulas e torneiras da graça. Sem eles, a água está “lá fora”, mas não chega até nós de modo eficaz.

 

 

E mais: a torneira pode estar aberta ou fechada.

Quem se aproxima de um sacramento com fé, arrependimento e desejo sincero, abre a torneira. Quem vai por costume, sem fé ou em pecado grave, fecha a passagem da água, mesmo que o tubo esteja lá.

 

Os santos entenderam isso profundamente. São João Maria Vianney dizia: “Se soubéssemos o valor de uma só Missa, morreríamos de amor.” E Santo Afonso dizia que “de todos os meios de salvação, os mais seguros, os mais suaves e os mais eficazes são os sacramentos”.

 

 

 

Mas… e a fé pessoal? Não basta?

 

Essa é uma pergunta legítima — e frequente. Muitos dizem: “Mas eu rezo, tenho fé, faço o bem… por que preciso dos sacramentos?”

 

A resposta é: porque a fé precisa de carne. Deus nos fez corpo e alma — e quer nos salvar corpo e alma. Por isso os sacramentos tocam o corpo para salvar a alma.

 

Sim, Deus pode agir fora dos sacramentos. Ele é livre. Mas nós não somos livres para escolher outro caminho senão o que Ele nos deu. E Ele nos deu os sacramentos. Quem os rejeita, rejeita os canais da graça instituídos por Cristo. É como quem tenta tomar água com as mãos, quando tem uma jarra ao lado.

 

“Os sacramentos são necessários à salvação dos fiéis na medida em que conferem a graça sacramental.”

CIC 1129

 

 

 

Como viver os sacramentos com fruto

 

  1. Preparação interior

Antes de se confessar ou comungar, pergunte-se: “Estou disposto a acolher a graça que este sacramento oferece?” Confesse com arrependimento sincero. Comungue com fé e desejo de transformação.

 

  1. Participação frequente

O ideal é confessar-se ao menos uma a cada 15 dias, comungar aos domingos e participar ativamente da vida litúrgica da paróquia.

 

  1. Formação doutrinal

Conheça o significado de cada sacramento. Estude o Catecismo. Leia os Evangelhos. A ignorância da fé é uma torneira entupida: a água está lá, mas não passa.

 

  1. Educação da família

Pais: levem seus filhos aos sacramentos. Ensinem com palavras e exemplo. Deixem que cresçam com sede da Eucaristia e confiança na confissão.

 

  1. Não espere ocasiões solenes

A graça não se limita às festas. Receba os sacramentos no dia a dia. A santidade nasce do ordinário bem vivido.

 

 

Os sacramentos no coração da liturgia

 

Os sacramentos são celebrados dentro da liturgia — isto é, da oração pública da Igreja. A liturgia é o espaço sagrado em que o céu toca a terra. E dentro dela, os sacramentos são o ponto culminante: é onde Cristo age diretamente, com seu Corpo, a Igreja, para santificar seus membros.

 

Cada gesto litúrgico tem sentido. O sinal da cruz, a genuflexão, o incenso, as vestes — tudo educa os sentidos e prepara o coração. O risco moderno é querer “só a graça” sem os sinais; ou “só os sinais” sem fé. A verdadeira liturgia une as duas coisas: sinal e graça, rito e vida, exterior e interior.

 

Por isso, os sacramentos não são apenas “momentos bonitos”: são atos salvíficos reais, presença viva do Ressuscitado entre nós.

 

 

 

Torneiras abertas, vida transbordante

 

A vida cristã não é um esforço solitário para “se elevar até Deus”, mas uma abertura humilde a um Deus que desce até nós, que nos lava, nos alimenta, nos unge, nos perdoa, nos fortalece — com água, pão, óleo, palavras e gestos.

 

O católico que compreende o valor dos sacramentos vive de joelhos, mas caminha firme. Porque não caminha sozinho: caminha com a graça.

 

Se você está cansado, seco, machucado, busque os sacramentos. Eles não são prêmio para os perfeitos, mas remédio para os fracos.

 

“Se conhecesses o dom de Deus…” (Jo 4,10)

 

A torneira está aí. A água está jorrando. Só falta abrir o coração.

 

Indicações de leitura:

SACROSANCTUM CONCILIUM – SOBRE A SAGRADA LITURGIA Os sacramentos na vida espiritual – Fr. Edouard Hugon

 

Referências bibliográficas:

 

•     Catecismo da Igreja Católica: nn. 1131, 1129, 766

 

•     Santo Agostinho: “Sacramentum est visibilis forma invisibilis gratiae.”

 

•     São Tomás de Aquino, Summa Theologiae, III, q. 60

 

•     Bíblia Sagrada: Jo 4,10; 1Cor 11,27-29

 

•     São João Maria Vianney, sermões

 

•     Santo Afonso de Ligório, Prática do Amor a Jesus Cristo

 

 

 

 

Franklin Ricardo, Católico, esposo, pai de quatro filhos, estudante de artes liberais, filosofia e teologia, apaixonado pela cultura latina e pelos grandes clássicos da cultura ocidental; ex-ateu, converso pela graça santificante.

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