Carlos Karoá escreve: ‘TERRA PROMETIDA’

TERRA PROMETIDA

 

Dois mil, não chegará!

A gente ouvia a sentença aterradora e ficava por alguns segundos, a lamentar a morte precoce do mundo, de forma tão bisonha.

Soava como o ribombar dos trovões noturnos, quando “nosotros” ainda guris, percebíamos pelas frestas dos telhados, nas noites das trovoadas, o corisco riscar os céus e o estrondo das nuvens carregadas, fazer tremer paredes e inevitavelmente, fazer a gente se encolher de medo. Confesso despudoramente, que ainda garoto tinha receios furtivos quando a turma da velha guarda, me jogava a frase temerosa nos ouvidos: “Dois mil não chegará”

É que mesmo sem saber das minhas verdades adultas, já trazia pulsando na cachola, este amor imensurável pela vida humana. Ela é sem nenhuma dúvida, uma dádiva venturosa das forças que regem o pulsar infinito deste chão. O planeta terra, nesta galáxia azulada, tem a cor mais linda da nossa constelação.

A diversidade de coisas, que na Terra tem, é a razão deste amor infinito que todo ser vivente carrega dentro de si, de ver o amanhecer de cada dia, por mais vezes que o divino permitir.

Não há comparações, a vida é única.

A ventura de acordar e sentir os sabores da mesa farta ou simples, merece gratidão eterna. Se no dia que começa, o labor é dever de todos, pois viver a alegria de ser útil, do orgulho de ser capaz de produzir e gerar serventias, dispensa comparações. Talvez da tua janela, te abençoes a visão imensa das águas do mar e esta companhia te induzas a compartilhar a sua grandeza e os seus mistérios. Sentir o cintilar do alvorecer do dia, trazendo incômodos ou alegrias, viver a beleza ímpar do azul prata do luar, trazendo paz de espírito e a ciência de que neste mundo nada igual existe, nada mais tem a força da grandeza, que uma noite prateada de lua cheia. A natureza é colossal.

O aconchego ou pretensa letargia numa cama de amores, após o labor de horas, é como ungir o corpo de plena adoração. Coisas rebuscadas, ou o primor da simplicidade também a nós, causa admiração.

O universo é pleno, como se nada faltasse para esta plenitude. O remédio para os males que virão, está em algum lugar, basta procurar, é um desafio que parece uma brincadeira de esconde-esconde dos deuses da criação. Se nos chega o espanto, pela vez da inovação, também somos gratos por aquilo que está indo embora, pois ceder espaço para o novo, são os chamados, ventos da renovação.

Vivenciamos lágrimas sinceras por corações felizes, vivenciamos lágrimas sinceras pela dor da agonia. Lágrimas sinceras de saudades ou a ventura de ter de alguém, para a nossa companhia. Tudo é válido neste jogo de viver a vida.

A ciência faz a afirmação temerosa, que a nossa bendita estrela solar, pela sua natureza estelar, um dia, pela ausência de insumos para consumir, fatalmente apagará. Aqueles que pensam que este planeta é uma criação divina, certamente não concordam com tão terrível afirmação, mas a tese existe e pra mim, faz todo sentido. O alívio em tudo isto, é que ainda teremos alguns bilhões de anos de água passando pela ponte e até lá, vamos curtir este planeta azulado de tantos amores.

Vamos admirar as asas de aço dos aviões e reverenciar o poder de voar dos pássaros, com suas asas de penachos.

Agradecer pelo alvorecer de cada dia, dormitar em delírios de gratidão pelo manto negro da noite, que nos faz adormecer e dar ao corpo, a sagrada hora do descanso.

Quanta coisa nos acerca, quanta coisa existe, que merece de nós o crivo de “divindades”.

Dos amigos, a amizade. A saúde no corpo e na mente, a liberdade. Dos amores, os louvores da felicidade.

O equilíbrio das duas rodas da bicicleta, o mistério da metamorfose das lagartas e borboletas.

A natureza divina da flor do algodão, as sementes parindo frutos diversos no mesmo chão.

As flores que além da cor, dar também o seu perfume, dos pirilampos o lume, brilho dos vagalumes.

Do bicho da seda, a delicadeza, na natureza, o calor ou frio que o tempo faz.

Na rotina dos dias, tudo ou quase tudo, que nos apraz.

Nas mãos humanas, a arte em forma de pintura, a chuva abençoada que nos brota das alturas a aridez do deserto sem nenhuma serventia, o prazer secular da gastronomia e a dúvida se tudo isto vai ter fim ou pode mudar um dia.

No trabalho, a dignidade daquilo que construímos, os segredos, os mistérios, os males e curas que descobrimos, a beleza perenizada numa fotografia, o canto, a dança, o folclore, a ventura ou muitas vezes, a nostalgia.

O vaticínio de que “dois mil não chegará” não se cumpriu e a terra continuará o seu caminho, e certamente chegará aos beirais da eternidade, caso o sol, num longínquo dia, deixe de brilhar.

Enquanto isto não vem, louvemos a música que segundo meu amigo Zeca de Alaíde, é deste mundo a única unanimidade.

Ouça você, que agora lê este texto, a canção

“Wee Midnight Hours”

A banda da Louisiana “Tuba Skinny” especialista em jazz e blues, com o dueto Greg e Érica, certamente vai lhe emocionar.

Letra e harmonia perfeitas.

Carlos Karoá, amante de música e cinema, também tem paixão pelo universo das letras. Em 1970, deixou Morro do Chapéu com destino a Salvador, como fazia todo jovem interiorano daquela época. Hoje aposentado, retorna à nossa cidade em busca de uma vida mais tranquila. Gosta de escrever crônicas e pequenos contos, sejam eles verdadeiros ou não.

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