Carlos Karoá escreve: ‘Futuro Brilhante’

DIA-A-DIA ENTRETENIMENTO MORRO DO CHAPÉU REGIONAL

FUTURO BRILHANTE

 

Vez em quando, de olhos no teto do quarto do sono, me pego sentindo saudades daquilo que em minha vida, foi deverasmente inolvidável. Acredito que na vida de todos nós. Alguns fatos foram tão relevantes, que nem mesmo a caduquice vai lhes deixar embotados, nas ” mufas” cerebrais que a gente tem lá dentro das cacholas pensantes, de cãs já agrisalhadas. Também quando o “velho Morfeu”, mal-humorado, não me quer em seus braços, meus pensamentos viajam em devaneios tão absurdos, que outro dia, ou quem sabe noutra noite, me peguei sentindo saudades absurdamente doloridas, do meu futuro. Vivi um passado memorável, vivo um presente adorável e o futuro dos meus sonhos, unicamente por razões de tempo, lamentavelmente comigo de olhos arregaladinhos, não vai acontecer. Mas, de pés plantados no chão, confesso que gostaria de estar neste ocaso divinal, quando este tempo chegasse, para nele estar, para nele viver, para nele, sentir os primeiros raios do amanhecer.

Queria estar no amanhecer de um bom punhado de anos adiante, do sol que me alumia agora. Acredito na força resolutiva do homem, no seu poder de criar soluções e sei que este planeta a cada dia passado, será onírico até para o morador da “ponta da rua” porque morar na “ponta da rua” será apenas um detalhe de ermitão, desfrute opcional de solidão. Tudo ou quase tudo pra beirar a racionalidade, será um desfrute de ações.

A boa e velha culinária, será fantástica para todos, até os mais destoantes paladares. Os carboidratos, as proteínas e os sais minerais, imagino que serão condensados em tabletes saborizados e coloridos, com o palato distinto de cada consumidor. É evidente que o consumo ” in natura” de nutrientes também estará em balcões de venda, porque não se pode abdicar de costumes vividos desde o começo das eras. Por opção de vida, gordinhos e magricelos estarão a perambular pelas ruas, democraticamente. Lá no meu futuro, vamos estar a viver como os nossos primos do “jardim do Éden”, com a diferença sorrateira, que não poderemos andar apenas com uma folha da parreira, escondendo certas coisas.

Os telefones celulares, estes vieram pra ficar. Pelo menos lá no meu futuro eles estarão, vivinhos da Silva, porque não se pode fazer comunicação sem ter nas mãos um aparelho transmissor de vozes. É evidente que a diferença entre aqueles telefones de caixa de fósforo que a gente usava quando meninos e os celulares lá da era das minhas abstrações, é inimaginável até pra mim que sou um inveterado sonhador. Por acessibilidade quantitativa de informações, terão praticamente o mesmo tamanho dos usados agora, mas, suas resoluções, serão inacreditáveis pros dias de hoje. Tirando uma linha nos meus pensamentos, acredito que até matar em defesa própria, quem estiver em perigo de perder a vida, com certeza eles serão capazes. Raios ultravioleta de absurda fatalidade em seus bojos. A supra ciência cuidando da segurança dos mais vulneráveis.

Os drones, serão as estrelas permanentes destes caminhos de vias invisíveis. Campearão nas manhãs tardes e noites, nas horas cheias que o tempo tem. Obedecerão às regras de navegação aérea, nos ritos de capacidade, aptidão e segurança. Estarão habilitados mediante altitude, velocidade, distância entre si, tipos de carga, peso, natureza do voo, finalidade e destino. Serão lindos, impressionantes, coloridos e levemente silenciosos. Apenas emitirão o zumbido natural dos seus vetores de ar, critério mor de sustentação, direção e estabilidade. Neste meu futuro de milagres tecnológicos, cruzarão os céus diuturnamente, num ofício de levar alegrias, necessidades, objetos fúteis ou não, saúde e vida de cunho coletivo. Farão o transporte de cargas pequenas, encomendas rápidas, animais, alimentos, tudo enfim que demanda mudanças de lá pra cá ou vice-versa. Terão nas embalagens do seu bojo, capas de segurança, preciosismo, competência e perfeição.

Queria estar lá, como aqui estou agora. E este futuro distante não me pertence, apenas por falta de longevidade, porque penosamente me falta o parentesco com o velho Matusalém. Se verdade bíblica realmente foi, gostaria nesta hora de ser seu filho. Queria estar no meu avarandado, contumaz das minhas manhãs e tardes pachorrentas, talvez preguiçosas porque velhinho eu já era. Iria adorar receber visitas de amigos ou Tata tataranetos, ou netas, abotoadas a foguetes ou usando botas com propulsão a nitrogênio líquido. Todos daquele tempo, estarão com pleno domínio na arte de voar. Está premissa eu sei, está a anos de distância, mas maravilhosamente será uma verdade natural, visionária talvez nestas manhãs de agora. Poder voar, um sonho desde a invenção da roda, vai estar na ponta dos dedos dos mortais, lá do meu futuro que eu infelizmente não vou estar. Estas ilusões delirantes de bater asas nos céus, estão nos rastros dos gregos Dédalo e Ícaro, com diferenças alarmantes para se ir do chão aos céus, entre eles e o meu tempo dos primores.  Para fugir dos seus cativeiros, estes seres mitológicos usaram nacos de cera para alar os pés. No tempo que estou a imaginar, esta propulsão terá como embasamento, a mais grandiosa e fantástica tecnologia. Saber o que será consumido para este voo de anjos humanos, é uma pretensão que não me atrevo a ter, a fazer afirmações que a minha imaginação, não pode alcançar.

A frase ” nem só do pão vive o homem”, me acompanha desde o tempo das bolas de gude.  A informação que tenho a respeito dela, é que está na Bíblia. Se é verdade verdadeira não sei, mas que é uma verdade inconteste, dúvidas não há. O esporte, em todo o contexto que nos oferece, é um alimento que não está na mesa dos sabores, mas sacia como se no prato nos oferecesse. Praticá-lo é uma necessidade visceral, fazer parte da turba que torce por ele, é uma alegria eternamente juvenil, até pros velhinhos cuja mocidade foi embora. Lá no meu futuro dos alvores, o esporte em toda extensão de suas varas, tacos ou bolas, terá o amor e o respeito dos seus contendores. Pros amadores, a farra dos acasos, pros profissionais praticantes, o soldo justo e merecido, sem o mercantilismo dos absurdos salariais dos dias de hoje. As cifras citadas em tabloide ou telinhas de TV, beira a irracionalidade, são tão desbaratadas e surreais, que chegamos a desconfiar de suas veracidades. Certamente existirão outros moldes em disputa, mas acredito ainda que o futebol, pela beleza plástica e imprevisibilidade, continuará a pontear o mundo lúdico do desporto.

A política, este cancro universal que nos azucrina e nos envergonha, numa metáfora singular, lá no meu futuro, vai merecer nome de rua. O senado, desde sempre este órgão fútil e inútil, já não vai estar no custeio dos politizados eleitores. Sucumbiu-se nos excrementos dos seus anciãos, senhores da inutilidade, beneficiários longevos, desde quase o nosso império. O odor nauseabundo da sua desutilidade tornou-se insuportável, afundou na lama que eles mesmos criaram e enfim, o desuso foi irreversível. Com um sistema unicameral respeitável, sim porque isto é perfeitamente possível, num ambiente de eleitores racionais, posso imaginar decência e presteza lá no meu futuro que infelizmente eu não vou estar. Plausividade na hora das urnas, vai produzir homens probos, nas poltronas dos altos respaldos luzidios da lei. Lá, nos anos que ainda não sei, gritar publicamente para um Presidente “pega ladrão” não vai ser coisa do meu futuro, vergonhosamente vai continuar a ser, uma bestialidade fanatizada do meu passado.

 

Carlos Karoá, amante de música e cinema, também tem paixão pelo universo das letras. Em 1970, deixou Morro do Chapéu com destino a Salvador, como fazia todo jovem interiorano daquela época. Hoje aposentado, retorna à nossa cidade em busca de uma vida mais tranquila. Gosta de escrever crônicas e pequenos contos, sejam eles verdadeiros ou não.

1 thought on “Carlos Karoá escreve: ‘Futuro Brilhante’

  1. Então neste futuro descrito não haverá um texto tão bem humorado e verdadeiro, já que seu escritor diz que lá não estará?!… eu, cá pra mim, acho que estará, sim, com tantos outros imortais!…
    Parabéns Carlos Karoá!

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