Carlos Karoá escreve: ‘DESDE. SEMPRE!’

E tudo continua como d’antes…bla bla bla bla, esta cantilena ortográfica, jocosamente parida pelo povo português, numa chacota depreciativa aos soldados franceses, quando da invasão das tropas de Napoleão em terras lusitanas, sendo que naquelas horas de autoritarismo não havia governo constituído e evidentemente soldados para defender a pátria, uma vez que D. João Vl, tinha fugido para o Brasil, isto lá pelos idos de 1808.

Exemplifica fielmente o continuísmo da vida humana, nos quatro quadrantes da terra, apesar do nosso amado globinho, ser reconhecidamente redondo.

No quesito condições sociais de gente, a coisa muda é verdade, mas não do jeito que o gostaríamos que “sêsse”.

Dias antes do ano ir embora, quando aquele velhinho de barbas brancas e fatiota vermelha começa a invadir todos os buracos habitados, isto no lado ocidental e civilizado do planeta, os celulares se vestem de arautos perenes de boas novas e nos infestam de votos de sucesso, mal o alvorecer se desponta até a hora que o negrume da madrugada nos acerca. Chega a incomodar, suportamos porque são inofensivos. E, quando uma semana se vai e respiramos por fim o réveillon, se acentuam sobremaneira as mensagens e a história se repete, numa cópia tragicômica, que insiste em se tornar eterna.

Ano passado, minutos antes de 2024 mergulhar no obscurantismo do negrume eterno, percorri o mesmo caminho na espera festiva de 2025. Ao meu redor, os mesmos parentes e aderentes, alguns metros adiante ou cutucando as minhas costas, grupos de geração distintas, avós pais e filhos, como gado em direção ao poço. No nosso caso, porém, na busca das areias da praia e a imensidão copiosa do velho atlântico, o mar nosso do dia a dia. Fiquei a observar as roupas, reveladoras do chão onde os donos pisam. Predominantemente brancas, uma hora sedas

Confortáveis ou cetins brilhantes, com etiqueta do novo ainda a balançar na brisa leve do início da noite. Também, “fatos” coloridos ou brancos puídos, mostrando que já foram guardados, esperando o tempo de agora pra botar pra fora, de velhos guarda-roupas de ocasião. Mas todos, sem exceção, foram apinhados de votos de boas novas. “Neste ano que vem, vamos comprar a casa, vamos comprar o carro, vamos fazer um filho ou quem sabe, viajar de avião”.

O espocar de rolhas acontecem bilhões de vezes mundo afora, quando o ponteirão dos minutos, cruza a reta de chegada. E aí nestes benditos segundos, as diferenças sociais estão nas garrafas que logo, logo serão esvaziadas, na companhia de luzes multicores dos fogos de artifício.

Espumantes Sec ou demi-Sec Brut ou Chandon

Para os paladares mais distintos, a caríssima de notinhas verdes ” Champagne D. Perinon 55.

Champagne nacional, vinho branco, cidra e o nível acompanha naturalmente, a conta bancária do festeiro, porque quando a realidade é financeira, não se faz imitação de vida. Cumpre- se aquilo que convém.

Por aqui, quando a imitação do “chic” se faz possível, espumantes de A a Z ganham as areias de praia ou salões de tudo, até os limites da velha cerveja. Todos comemoram o ano novo e se pensarmos positivamente, isto é o que verdadeiramente importa.

E tudo continua como d’antes no quartel de Abrantes. É assim que funciona. Políticos corruptos e ladrões, em onerosas cerimônias de posse, juízes recebendo auxílio moradia agora com nomes diferentes, desembargadores assinando sentenças de deferimento duvidoso, ricos mais ricos, pobres mais pobres, vida mais difícil e a polaridade exacerbada cada vez mais imbecilizada. Ano que vem, certamente será mais uma cópia do ano que passou.

Vaticinios vazios, desejos sombrios e a mesmice que não nos abandona.

Se não mudamos, nada vai mudar.

Quem viver verá.

 

Carlos Karoá, amante de música e cinema, também tem paixão pelo universo das letras. Em 1970, deixou Morro do Chapéu com destino a Salvador, como fazia todo jovem interiorano daquela época. Hoje aposentado, retorna à nossa cidade em busca de uma vida mais tranquila. Gosta de escrever crônicas e pequenos contos, sejam eles verdadeiros ou não.

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